segunda-feira, julho 26, 2004

Minhas Febres Ficcionais

Pessoas Queridas,

Antes de mais nada, quero que saibam que estou muito feliz por vocês continuarem comigo. É claro que nunca duvidei de sua amizade, de seu carinho... mas, por outro lado, estive afastada da rede durante um bom tempo, e os livros da Estante estavam começando a criar teia de aranha. Felizmente, parece que esse período está chegando ao fim, ao mesmo tempo em que eu vou me recobrando de mais uma das minhas febres ficcionais.

Vocês já ouviram, com certeza, falar em “bloqueio de escritor”: aquelas fases pelas quais todos nós (a não ser os extremamente disciplinados, suponho) passamos no decorrer de nossas vidas de escrevinhadores amadores ou profissionais. Isso aparece muito nos filmes... a pessoa se senta diante do papel (em geral é uma máquina de escrever, ultimamente já aparecem computadores) e fica durante horas fitando aquele espaço em branco. No caso dos mais agitados, aparece depois uma outra cena em que ele/ela arranca o papel da máquina e o amassa e o joga no chão já coberto de bolinhas de papel... e assim vai, numa seqüência que já conhecemos, até que aconteça o fato que vai tirar nosso/a valente escriba desse estado de suspensão.

Ao longo dos 30 anos em que venho escrevendo (não: isto não é um exagero), eu passei por essas fases com freqüência, ficando longos períodos, às vezes anos inteiros, sem produzir uma linha sequer; Atualmente, as exigências do trabalho, o estímulo proporcionado pelos leitores deste blog e de meu livro (que los hay, los hay!) e um mínimo de disciplina conseguida a duras penas me levam a manter uma certa “produção mínima”, embora nem sempre no campo ficcional. Então, à parte algumas linhas acrescentadas a um conto, uma ou outra revisão e um poeminha bissexto, fico escrevendo apenas artigos, textos para a Biblioteca Nacional e reflexões em meu diário. E, como já me conheço de outros Carnavais, fico esperando a próxima onda que vai me levantar e me levar a produzir páginas e mais páginas de prosa.

Se alguém me perguntar, não sei dizer como acontece. Pode ter a ver com a posição dos astros – algo como Mercúrio conjunto a Marte ou em trígono com a Lua – mas também, possivelmente, com algum estímulo externo, como um livro que eu tenha lido, uma imagem num filme, algo que me disseram durante uma conversa. Realmente, não sei explicar. Só sei que, ocasionalmente, surge alguma situação que aciona um “mecanismo” dentro de mim... e eu me vejo compelida a escrever, a escrever, a escrever febrilmente e quase sem descanso.

Esses períodos são muito produtivos, mas também me deixam cansada, talvez da mesma forma que acontece com um folhetinista ou um autor de novela. Nesse período, leio muito pouco, assisto pouco a filmes, emprego na escrita a maior parte do meu tempo de lazer. E outro tipo de tempo também, confesso... Em 1991, escrevi capítulos e capítulos de “O Clã da Raposa Branca” (da fase da fantasy pré-histórica) na empresa em que fazia estágio; “O Caçador” foi escrito na nossa casa em Lisboa, e os anos (1995 e 96) em que trabalhei na PUC foram muito áridos, anos de bloqueio de escritor, mas em 1997 recomecei a escrever as histórias de Athelgard, e não pequena parte delas foi rabiscada durante minhas aulas do Mestrado. Felizmente, o auge da febre havia cessado na época de escrever a dissertação. Pois como eu poderia falar sobre Tecnologia da Informação com todos aqueles caçadores, guerreiros e saltimbancos aos pulos na minha cabeça?

As últimas “febres ficcionais” têm sido mais disciplinadas, mas são perceptíveis mesmo assim. No ano passado, eu estava numa fase muito segura e tranqüila. Escrevi apenas um conto, “O Potro Dourado”, mas revisei as 680 páginas da minha trilogia “A Irmandade” (todo escritor de fantasy que se preza deve ter sua própria trilogia!) e reescrevi trechos de “O Caçador”. Também publiquei artigos em revistas e escrevi inúmeros posts para a Estante que demandaram pesquisa e uma certa técnica, se não um pouquinho de criatividade. Em suma, um período muito bom.

Já este ano, depois de publicar “O Caçador”, eis que uma onda me pegou de surpresa... e, assim, passei estes últimos meses imersa num universo de ficção do qual é difícil sair para textos mais ligados ao cotidiano. Ao mesmo tempo, tive que assumir novas tarefas no trabalho e acabei por me comprometer, de certa forma, com atividades na Casa da Leitura, sem falar na vida pessoal - que eu jamais deixaria de lado – e no esforço para promover, um pouquinho que fosse, o meu primeiro livro. Com tudo isso, a Estante Mágica ficou meio abandonada, e só posso dizer em minha defesa que foi por uma boa causa. Quer dizer... Bom... Espero que ninguém discorde disso depois de ler “O Caçador” ou os contos de Athelgard! ;)

Enfim, pessoal... É isso. Entre bloqueios de escritor, períodos tranqüilos e disciplinados (meus prediletos) e il furore di scribere que me ataca de vez em quando, aqui estou eu. E devo dizer, mais uma vez, que é um grande prazer e uma grande honra tê-los comigo.

Até a próxima!

Abraços pra vocês,

Ana Lúcia

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